19/1/2004
A falta de um sistema democrático global impede que os países pratiquem a democracia dentro de casa, e o Brasil é um claro exemplo disso, de acordo com uma das estrelas do Fórum Social Mundial, que está acontecendo em Mumbai (ex-Bombaim), na Índia.
O escritor e ativista britânico Georges Monbiot, um dos nomes em alta no movimento antiglobalização, disse nesta segunda-feira que o governo Fernando Henrique Cardoso “até que tinha boas intenções, mas não pôde cumprir muitas delas porque o Fundo Monetário Internacional não deixou”.
Em outra entrevista, a economista Laura Tavares, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirmou que algo parecido acontece hoje em dia com o governo Luiz Inácio Lula da Silva, que se vê preso em uma “camisa-de-força” e não implementa as políticas sociais que gostaria.
Com base nesse tipo de constatação, Monbiot e outros participantes do fórum defendem que o melhor seria “eliminar sumariamente” o FMI, o Banco Mundial, a Organização Mundial do Comércio (OMC) e organizações semelhantes.
Contraste
A criação de instituições para gerir temas de interesse internacional, como o comércio e o meio ambiente, é um dos temas de destaque no quarto dia do fórum em Mumbai, o primeiro a ser realizado fora de Porto Alegre.
Os organizadores esperam que mais de 75 mil pessoas compareçam ao todo ao centro de exposições nos arredores da cidade, que tem mais de 16 milhões de habitantes.
O Fórum Social tem o objetivo de criar um contraste com o Fórum Econômico Mundial, e isso pode ser notado já na estrutura física dos dois eventos.
Enquanto o “fórum dos ricos” acontece no luxuosa estação de esqui de Davos, na Suíça, com toda a estrutura do Primeiro Mundo, o de Mumbai é feito em antigos balcões de fábrica convertidos aparentemente às pressas em salas de convenções, sobre um chão de terra batida e com muita poeira no ar.
Revolução
Apesar de Índia e Brasil, os dois países que estão associados à organização do Fórum Social Mundial, serem entusiastas do sistema multilateral e muito atuantes na OMC, por exemplo, há um certo consenso entre os participantes de que essas entidades “só servem para aumentar a miséria dos países pobres”.
O ativista sul-africano Trevor Ngwane, por exemplo, incorporou o discurso revolucionário, com palavras de ordem pela mobilização dos “povos oprimidos” para derrubar os atuais “detentores da riqueza e do poder”.
Mas nem tudo em Mumbai é niilismo. O economista filipino Walden Bello, outro porta-bandeira do movimento contra a globalização, defende que algumas entidades escapem da guilhotina.
Seria o caso do Mercosul, do Unep (programa da ONU para o meio-ambiente) e da Unctad (agência da ONU que trata da relação entre o comércio e desenvolvimento), que “sempre foi um bastião de defesa dos países pobres”.
“Também não me oponho a que o Banco Mundial continue existindo, mas como uma instituição de pesquisa sobre o desenvolvimento econômico”, disse Walden Bello.
Parlamento
Monbiot, porém, soa menos conciliador. Ele considera que apenas um parlamento mundial teria legitimidade para falar em nome de todos e criar estruturas para governar os grandes temas globais.
“Mesmo o Fórum Social, por mais admirável que seja, não é democrático, não representa os povos do mundo”, declarou o ativista britânico.
“Somos um grupo de privilegiados com passaportes e dinheiro.”
Fonte: BBC, em Londres