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Congresso aprova compra de trator, ambulâncias e até cesta básica em ano eleitoral

Medidas incluídas na Lei de Diretrizes Orçamentárias possibilitam base governista a barganhar recursos públicos em período eleitoral em troca de apoio político. Oposição critica.

Sem alarde, a base governista no Congresso Nacional aprovou um pacote de medidas que atropelam a Constituição Brasileira ao permitir a distribuição de recursos públicos em período eleitoral. Entre esses recursos estão equipamentos agrícolas como tratores, ambulâncias e até cestas básicas. Além disso, também permite que recursos já empenhados e destinados a munícipios possam ser transferidos.

De acordo com o texto das medidas incluídas no Projeto de Lei do Congresso Nacional (PLN) 17, que muda a Lei de Diretrizes Orçamentárias, os recursos já acordados com um município poderão redirecionados a outro município, ou o dinheiro reservado a uma obra poderá ter seu fornecedor trocado, sem a necessidade de planejamento. Desta forma, a manobra possibilita barganhas por apoio em tempos de eleição. O prefeito que apoiar o candidato ou o atual governo, leva o recurso.

A outra medida autoriza o governo a distribuir as cestas básicas, bens, valores ou benefícios para entidades públicas ou privadas até o fim deste ano, o que fere a lei eleitoral. Com isso, o governo pode tentar de forma ‘legalizada’ distribuir benesses para tentar reverter o resultado das pesquisas que mostram o ex-presidente Lula (PT) na liderança em todas as pesquisas de intenções de voto.

O projeto, que foi pautado durante as discussões da PEC do Desespero e da Lei De Diretrizes Orçamentárias, traz ainda um dispositivo que torna ainda mais obscuras as Emendas de Relator, chamadas de Orçamento Secreto. A identificação do relator da emenda que for transferida de um município para outro será ocultada, ou seja, ninguém sabe e ninguém vai saber para onde foram os recursos.

Na avaliação de parlamentares da oposição, a aprovação dessas medidas é uma manobra de apoio do Centrão ao atual governo, visando a reeleição de deputados e senadores do bloco governista, usando bilhões de reais do orçamento para isso. “É uma jogada do Centrão e da base de apoio de Bolsonaro pela manutenção do poder. Quem tem esse monte emendas são eles”, disse o deputado Ênio Verri (PT-PR).

Para o deputado a aprovação mostra também “a subordinação entre um governo que tem o cargo de presidente, eleito pelo povo, mas não tem poder nenhum porque terceirizou o poder de executar o orçamento para o presidente da Câmara Arthur Lira”. O deputado ressalta ainda que o projeto foi votado às pressas, sem alarde e sem leitura no plenário, portanto sem alterações, mas a oposição votou contra as medidas.

Para justificar as medidas, o relator do projeto, deputado Carlos Eduardo Gaguim (União Brasil-TO), afirmou que ’20 mil obras paradas por problemas contratuais seriam retomadas’, ao se permitir a mudança de destinatário dos recursos ou dos fornecedores.

Para Ênio Verri, a argumentação de Gaguim é somente um ‘jogo de palavras’. “Não tem obra parada no projeto. Concretamente, a medida tem trator, equipamentos, caixa d´água, ou seja, investimentos de interesse dos parlamentares para angariar apoio político”.

Para o deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP), com a aprovação a base governista mostra suas reais intenções. “Bolsonaro e o bolsonarimo não têm escrúpulos na operação boca de urna. É o orçamento secreto e miliciano. Para eles quanto mais ilegal, mais apoio eles têm de Bolsonaro”, disse.

Velha política desde o golpe

Em 2020, as eleições para prefeito e vereadores já foram atípicas, explica o analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Neuriberg Dias, sobre o pleito daquele ano ter acontecido durante o estado de emergência decretado por conta da pandemia do coronavírus, em que prefeituras puderam ter acesso a mais recursos em período eleitoral.

Agora, em 2022, ele diz, “é de fato o governo apostando todas as fichas para que isso [a liberação e recursos] se reverta em lucros políticos em um cenário de desvantagem eleitoral [de Bolsonaro]”. Neuriberg explica que o bloco que apoia Bolsonaro viu na manobra a possiblidade de viabilizar a destinação de recursos com a finalidade de barganha eleitoral sem incorrer futuramente em crimes de responsabilidade. ”Deram a legalidade de alteração constitucional para justificar despesas”, ele diz.

E reforça que, do ponto de vista do gasto do Orçamento Secreto, que passa de R$ 60 bilhões, “esses recursos vão ser gastos na busca de apoio de prefeitos para as eleições”. O projeto ainda depende da sanção do presidente da República, mas, de acordo reportagem no Estado de SP, o Centrão já havia combinado o apoio do Planalto às propostas.

Entenda o que é orçamento secreto

Com apoio de membros do governo, parlamentares criaram a figura de emendas do relator em 2020. Existem quatro tipos de emendas: individual, de bancada, de comissão e da relatoria. As emendas de relatoria são definidas pelo deputado federal ou senador escolhido como relator-geral do Orçamento a cada ano, em negociações geralmente informais com os demais colegas, para liberar recursos sem transparência, sem controle e sem sequer saber a destinação do dinheiro. Daí o nome orçamento secreto. Na prática, as emendas do relator costumam ser usadas para destinar dinheiro a obras e projetos nas bases eleitorais dos parlamentares, o que acaba aumentando o capital político deles.

Por que é chamado de “secreto”?

Embora o dinheiro do esquema esteja no Orçamento Geral da União, a destinação das verbas é feita de forma sigilosa – a partir de acordos políticos. Ao contrário das emendas individuais, não é possível saber quem indicou o quê.

Quem descobriu a mamata?

A partir de maio do ano passado, o jornal O Estado de S.Paulo” publicou série de reportagens mostrando o uso e as negociações dos recursos das emendas de relator. Uma das matérias apontou como o governo distribuiu cerca de R$ 3 bilhões por meio de emendas de relator a pedido de parlamentares, em parte, para comprar tratores com suposto sobrepreço. Outra apontou como o dinheiro foi destinado a estatais que seriam comandadas por aliados políticos de deputados e senadores do Centrão, como a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf). Segundo as reportagens, os maiores beneficiados foram parlamentares alinhados ao Planalto, entre eles Arhur Lira e Ciro Nogueira, ministro-chefe da Casa Civil, ambos do PP.

Qual o benefício disso para o governo Bolsonaro?

A medida é uma forma de beneficiar alguns congressistas com “emendas extras” para aplicarem em suas bases. Eles escolhem ações em municípios com prefeitos aliados e, assim, podem garantir a reeleição desses deputados e senadores em 2022. Dessa forma, o governo negocia apoio em votações importantes no Congresso Nacional.

Autor: Escrito por: André Accarini | Editado por: Marize Muniz  |  Fonte: CUT Brasil

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