A mídia em escala mundial joga ao vento a voz dos seus patrocinadores para impingir a seguinte mentira : os países estão em crise porque a população envelheceu e a previdência não tem fundos para suportar os gastos. Como solução, apresentam regras para dificultar a aposentadoria e para baixar os benefícios atualmente pagos. O importante para os banqueiros é que os países tenham superávit primário para pagar os juros das dívidas, sem questionar por que as pagam e se os valores são justos.
Quando vi no cinema há muito tempo o filme "No ano de 2020" (Soylent Green), achei um exagero a ficção, mas hoje a realidade parece mais próxima, desgraçadamente. A estória se passaria no ano de 2022 (apesar do título em português), e mostra um mundo decadente, com pessoas morando nas ruas em meio ao lixo, tratadas como animais pelas forças de segurança, sem emprego nem comida, enquanto a mínima elite viveria em verdadeiras fortalezas guardando frutas em cofre, etc. Ao povão o sistema ofereceria alucinógenos e um tablete de comida verde (soylent green), que depois se descobriu que era feito de restos dos mortos. Clique aqui para ver o trailer.
Como a vida das pessoas sem perspectiva seria de puro desgosto, esperando pela hora da morte, uma solução do sistema seria a morte voluntária, uma eutanásia com requintes de último desejo, com refeição farta, confortos e uma morte suave por gás letal enquanto se assistia em telões imagens fantásticas de coisas que não existiam mais, como mares cheios de vida, animais, um mundo nostálgico e idealizado do passado. Os mais velhos, que tinham vivido num mundo bem melhor, viam na eutanásia uma boa saída para aquele sofrimento.
A idéia do filme é cruel, mas se olharmos para o que os bancos querem, temos que começar a desconfiar até da vacina do idoso, que quando começou a ser oferecida eu presenciei, no nordeste, pessoas que não queriam tomá-la achando que era coisa do governo para matar os velhos. Bancos não têm compaixão : tiram sangue mesmo, e por que não dos idosos, que "custam caro" e não dão retorno em mais-valia, na visão deles?
Se os países começarem a forçar para pior a condição dos aposentados poderá haver convulsões sociais. No caso do Brasil, onde a ameaça está momentaneamente afastada porque a economia cresce e formaliza trabalhadores, a aposentadoria do trabalhador no campo sustenta muitas famílias, que teriam que migrar para inchar grandes cidades em busca de empregos. Isso elevaria os índices de criminalidade e as demandas por habitação, saneamento, transportes e serviços básicos (água, luz, energia) por elevar a complexidade urbana. Manter as pessoas onde estão suas raízes é muito mais eficiente que deslocá-las, e hoje esse custo é pago pela aposentadoria.
Na Europa, o que dá estabilidade hoje aos governos é o sistema de previdência ainda remanescente do "welfare state" da década de 50, quando para fazer frente à ameaça do comunismo as elites cederam benefícios para manter os trabalhadores imunes a idéias radicais. Se começarem a cortar esses direitos, haverá convulsão, e isso vai começar a ser visto nos próximos meses na Grécia, Itália, Espanha, etc.
Muitos desses países entraram em crise por não querer taxar os mais ricos, gerando déficits. Outros patrocinaram a iniciativa privada com privilégios fiscais e subsídios. Fora os que têm orçamento militar bem maior que os de previdência e saúde juntos, um dinheiro jogado fora com o objetivo de matar outras pessoas. Com a articulação de bancos e agências de risco, cada vez mais os países foram se rendendo aos ataques especulativos, pagando juros mais altos e entrando numa espiral de crise sem solução.
Na última reunião do G-20 não se conseguiu criar mecanismos de controlar o sistema financeiro porque alguns deles, de tanta submissão, negam que os grandes bancos são um verdadeiro cartel, chamando-os de "mercado". Ninguém fala em moratória para negociação soberana, nem nos países se articularem para fazer isso conjuntamente, botando os bancos no canto da parece.
Ainda no Brasil, o sucesso de Lula foi ter feito transferências de recursos governamentais aos mais pobres, com os programas de renda mínima. Como o pobre não poupa, consome tudo, e alimenta a economia desde os mais longínquos pontos do país, gerando um efeito multiplicador de valor em toda a cadeia comercial e industrial, a economia se mantém aquecida pela demanda mais básica. Essa criação de demanda impulsionou os investimentos no lado da oferta nos últimos anos, inclusive contando com capital estrangeiro, que hoje escasseia nos países em crise mas aqui cria empregos e mais renda.
O rico não quer pagar pela pobreza residual do capitalismo. Quer o dele, e o resto é problema do governo, para o qual também não quer pagar impostos. Sobra para a classe média, como vemos nos Estados Unidos, onde Bush deu mais privilégios aos ricos e tirou mais dos pobres. Obama hoje trava uma batalha feroz para tentar tirar alguns centavos dos mais ricos,. e ainda fez o jogo dos banqueiros locais injetando trilhões de dólares para ajudá-los na crise. O fato é que se o rico quer andar na rua sem necessitar de um séquito de guarda-costas, e se quer morar numa casa que não seja um bunker, tem que pagar para manter a sociedade vivendo em níveis satisfatórios. Não os do mundo de 2020 do filme, matando principalmente os velhinhos.