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Entrevista: Marisa Stedile, secretária geral da CUT-PR

 Quem disse que greve é coisa do passado?

 

Nos últimos meses Curitiba tem vivido uma efervescência de greves em diferentes categorias de trabalhadores. No serviço público municipal de Curitiba, a agitação toma conta de vários segmentos que demonstram insatisfação com a situação atual. O Jornal do Sismuc deste mês conversou com a secretária geral da CUT Paraná Marisa Stedile sobre a onda grevista. Ela também faz uma análise da conjuntura regional.

 

Jornal do Sismuc: Como você analisa esse ciclo grevista do segundo semestre aqui em Curitiba (bancários, correios, petroleiros, metalúrgicos, médicos e dentistas)?

 

Marisa Stedile: Acredito que todos os segmentos envolvidos tinham fortes razões para as greves que foram feitas e avaliamos que todas tiveram adesão dos trabalhadores e apoio da população. Destaco, porém, que há diferenças significativas entre os diferentes movimentos. Por exemplo, os bancários e correios lidam com necessidades de consumo enquanto que os médicos e dentistas tratam de necessidades imediatas e intransferíveis, onde a pressão tende a ser maior. Por outro lado, petroleiros e metalúrgicos, por serem do setor industrial, não sentem a pressão da população quando paralisam suas atividades. Quanto à greve dos correios, minha opinião é de que faltou sensibilidade e respeito por parte do governo. Não é aceitável que um governo eleito pelos trabalhadores se recuse a negociar e jogue no campo das ameaças para coagir as entidades sindicais. Vejo que a classe trabalhadora organizada tem o direito e luta para participar do resultado do crescimento econômico iniciado ainda no governo Lula e que segue agora no governo Dilma.

 

JS: Interessante perceber que praticamente todas as categorias que se mobilizaram têm conseguido conquistas significativas. Será que estamos superando aqueles argumentos burocratas de que a greve é um instrumento ultrapassado?

 

MS: A greve ainda é o instrumento mais efetivo para realização de conquistas. A negociação é essencial, mas ela só terá ressonância se estiver respaldada por forte mobilização da categoria representada. Quando os patrões se deparam com assembleias esvaziadas com certeza a proposta será do mesmo tamanho, menor do que os trabalhadores merecem. E isso se aplica ao setor público e privado. No setor privado o lucro é sempre a prioridade do patrão e no setor público a prioridade é pagar menos para sobrar mais para obras e programas que possam resultar em votos em ano eleitoral. Como nada vem de graça, o dever do trabalhador é lutar pelos seus direitos.

 

JS: Apesar das greves, tenho a impressão de que essa revolta ainda não se traduz em uma percepção crítica da sociedade. O que falta para que mobilizações grevistas ultrapassem o plano econômico e se tornem ações de consciência política?

 

MS: Mesmo quando lutamos por melhorias econômicas temos a condição de refletir sobre o modelo de sociedade que vivemos, e é fundamental que as contradições de classe sejam mostradas e realçadas nestes períodos. O pano de fundo do modelo capitalista é a “luta de classes”, em que os nossos interesses se chocam com os interesses patronais. Nesta queda de braço podemos perceber quem está do nosso lado e essa reflexão pode proporcionar a descoberta da consciência política, e essa consciência é que produzirá um novo paradigma, onde o lucro com certeza não deverá ser a meta.

 

JS: Existe um senso comum de que o curitibano e o paranaense em geral é um povo pacato, de tendências conservadoras. Pensando no movimento Fora Derosso, como você percebe isto?
MS: Estou em Curitiba há 16 anos e considero que o povo curitibano é mais reprimido dqueo conservador. Essa repressão pode transparecer uma imagem irreal da população na medida em que temem sofrer represálias caso participem de atos ou protestos públicos. Em relação ao Movimento Fora Derosso, eu diria que por muito menos que os R$ 34 milhões repassados a sua esposa, outros políticos já teriam caído, e isso independe da pressão popular, é uma questão de justiça. Agora, é certo: se o povo saísse às ruas o resultado poderia ser outro e a punição mais rápida.

JS: Na sua opinião, qual deve ser o papel da CUT Paraná e do sindicalismo em geral na atual conjuntura, onde o governo do estado sinaliza com uma política de privatização, corte de gastos sociais, parecida com o que vivemos em nível federal na era FHC?

 

MS: O governo do Paraná adotou uma política de contenção de gastos quando se trata do funcionalismo ou de programas sociais e isso deve ser combatido pelo movimento sindical. A arrecadação do Estado vem crescendo na mesma proporção do crescimento econômico e o papel da CUT é cobrar políticas sociais e de valorização do serviço público. Para isso temos de apoiar nossos sindicatos e denunciar qualquer ato de governo que possa levar à privatização, sucateamento ou prejuízo dos serviços públicos. Neste ano não houve as contratações previstas para o setor da saúde, por exemplo, os concursados aguardam, o povo sofre as consequências, enquanto o governo infla seu caixa. O que vão fazer com o superávit?

 

JS: Em que medida é possível comparar o governo de Beto Richa/Luciano Ducci ao de Jaime Lerner? Na sua opinião, o "lernismo" esgotou-se? No que os trabalhadores devem ficar atentos?

 

MS: Considero que são alunos da mesma escola. Beto Richa era deputado estadual, da base de apoio ao Governo Lerner e votou projetos prejudiciais ao povo, como a privatização do Banestado e outras tantas. Depois virou vice de Taniguchi, onde aprendeu bem a lição privatista. Luciano Ducci foi seu vice duas vezes e teve tempo pra aprender. Eles chegam com um discurso “moderno”, de “choque de gestão” e querem fazer crer que são “técnicos” e não “políticos”. Mas no fundo usam a “técnica” para impor sua ideologia, adotando medidas que em geral vão contra qualquer projeto de sociedade que promova políticas públicas de qualidade para o conjunto dos trabalhadores. Gestão pública é muito mais que engenharia, é questão de humanidade e projeto de sociedade que contemple inclusão social.

 

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