Foi realizada na noite desta quinta-feira, 16 de março, a Roda de Conversa sobre resistência de mulheres na Ditadura Militar. A atividade integrou o calendário do #8MdasMulheresProtagonistas e reuniu dezenas de bancários, financiários, militantes e interessados em debater a participação das mulheres no processo de resistência contra a ditadura e na luta pelo restabelecimento das liberdades democráticas no País. Conduziram o debate as advogadas Clair da Flora Martins e Ivete Maria Caribé da Rocha, integrantes do grupo militante Geração 68.
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“Nossa democracia está, cotidianamente, ameaçada. Prova disso é que recentemente, no dia 08 de janeiro, assistimos a um lamentável atentado ao Congresso Nacional e ao STF, num movimento que questionou nossa democracia e pediu intervenção militar”, iniciou Clair. “Na resistência contra a ditadura de 1964, eu tive que fugir, fui presa, condenada e torturada. Foi preciso muita luta para conseguirmos derrubar o regime e conquistar uma Constituição cidadã. Eu tive a sorte de estar viva, mas muitos companheiros foram violentamente assassinados”, lembrou. “Nosso objetivo aqui é rememorar o horror que foi a Ditadura Militar no Brasil e conscientizar as pessoas sobre os crimes cometidos, para que isso nunca mais aconteça. Ditadura nunca mais!”, completou.
Ivete Maria integrou, em 2013, a Comissão Estadual da Verdade Teresa Urban, que teve por finalidade examinar e esclarecer as violações de Direitos Humanos praticados no Paraná no período de 1946 a 1988. Atualmente, coordena o Comitê Estadual da Memória, Verdade e Justiça, que objetiva levar adiante as recomendações da Comissão da Verdade. “Durante todo o trabalho que tivemos, muitas mulheres foram ouvidas. Eram depoimentos terríveis, que nos faziam chorar! Queremos, hoje e sempre, homenagear todas essas mulheres que fizeram parte desta luta e tiveram um papel muito importante”, afirmou.
Depoimentos
“Em 1968, eu era caloura do curso de História da UFPR e participava ativamente do movimento estudantil. A repressão era muito forte e, a partir do AI-5, se tornou ainda maior: imprensa, literatura, cinema e as artes em geral eram fortemente censuradas. Em contrapartida, havia uma intensa propaganda do Regime Militar, ou seja, havia muito investimento em contrainformação e repressão. Nos anos 1969 e 1970, os movimentos sociais foram encurralados e a resistência ao regime foi estraçalhada, numa derrota enorme. A oposição se reduziu ao partido MDB. Eu fui uma das pessoas presas, processadas e, evidentemente, condenadas, tendo que cumprir pena. Agora eu vejo que foram 21 anos de tentativa de implantar uma ‘burrice geral’, pois a ditadura emburrece as pessoas, interferindo em todos os campos da vida dos cidadãos, sobretudo, na educação formal, eliminando a reflexão crítica e os saberes. Me lembro até hoje da reforma educacional que foi realizada com a Lei 5.692/1971 e piorou muito a educação. Não podemos deixar morrer essas memórias, pois tudo pode se repetir. Esquecer jamais para que não se repita jamais!”
Judite Trindade, historiadora que lutou contra a ditadura.
“Em 1968, eu estava terminando a faculdade de jornalismo na UFPR e participava ativamente do movimento estudantil de resistência. Era uma luta diária, mas, mesmo sabendo que nossos nomes estavam nas listas do regime, isso não nos dava medo. Lembro que em 12 de outubro de 1968, a União Nacional dos Estudantes (UNE) fez um congresso em Ibiúna, para eleger seu presidente. Participaram cerca de mil pessoas, de todo o Brasil. Após a reunião, fomos todos presos, levados para o presídio Bandeirantes, em São Paulo. Ficamos uma semana detidos, fichados pelo Dops. Logo na sequência, decidimos fazer um encontro regional, quando fomos presos novamente e julgados culpados. Não havia justiça ou legalidade na ditadura. Cumpri minha pena e, depois, tentei voltar pra faculdade. Mas as coisas ficaram muito difíceis, foi só quando me transferiram pra Católica que consegui me formar e ir trabalhar. Minha irmã também foi presa, levada para um quartel. Ficamos mais de 7 dias sem saber seu paradeiro, enquanto ela estava sendo torturada violentamente, aos 17 anos. Passado um tempo, devolveram-na lá em casa e disseram: ‘Desculpe, foi um engano!’. Não podemos esquecer isso, de jeito nenhum!
Elizabeth Fortes, jornalista que lutou contra a ditadura.
Artigo 142 da Constituição
Após os depoimentos, a professora PhD em Filosofia Política e do Direito Rita Lins e Silva falou sobre as interpretações incorretas do Artigo 142 da Constituição brasileira. “Em muito momentos, o Artigo 142 foi requerido pelo Bolsonarismo a serviço do autoritarismo, de forma muito mal interpretada. Desejavam uma réplica do golpe de 1964, mas esse não é o tipo de ordem que trata o artigo. E importante reafirmar: o Artigo 142 fala de uma ordem institucional entre os poderes, que devem estar equilibrados. Ele fala em manter a lei e a ordem e não em rompê-las”, explicou. “Contudo, ele foi mal interpretado como se tratasse de ‘intervenção militar’, o que não existe na Constituição brasileira. Qualquer intervenção terá sido golpe, e é fundamental deixar claro que não existe a figura da ‘intervenção militar’ na Constituição”, acrescentou.
Por fim, a professora reiterou a importância da luta incansável e contínua em defesa da democracia: “Nós estamos aqui em defesa da memória. Temos a honra e a sorte de estarmos diante de uma memória viva. Momentos como estes são muito importantes, pois é nosso dever moral levar essa memória em forma de resistência para outros espaços, já que todos nós fomos vítimas indiretas da Ditadura Militar e a sociedade brasileira continua sendo vítima!”, disse. “Os fascistas estão entre nós e integram as instituições. Nenhuma instituição jamais esteve segura neste País”, alertou.
Programação completa
Para celebrar o 08 de março, Dia Internacional da Mulher, em 2023, o Sindicato está promovendo uma programação multicultural durante todo o mês. O objetivo é fomentar as diversas atividades culturais, sociais e políticas protagonizadas por mulheres. Os eventos serão realizados no Espaço Cultural e Esportivo da entidade (Rua Piquiri, 380 – Rebouças) e têm como público-alvo todas as pessoas.
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Fonte: Sindicato dos Bancários e Financiários de Curitiba e região