“Senhor Greca venha até aqui, não tenha medo. Índio não come gente, índio recebe o não-índio, então porque não querem nos receber? Prefeito bom acolhe todo mundo. Somos originários e porque a prefeitura não quer fazer nada por nós?”. A cobrança direcionada ao prefeito de Curitiba, Rafael Greca (DEM), é feita por Olívio Jekupé, escritor e professor indígena da etnia Guarani.
Jekupé é um dos organizadores do acampamento indígena montado ao lado da prefeitura para cobrar a reabetura da Casa de Passagem Indígena, fechada desde março do ano passado em razão da pandemia da Covid-19. Hoje, mesmo com praticamente todas as atividades flexibilizadas no município, o espaço de acolhimento segue fechado, sem que os povos originários tenham uma política pública na capital autointitulada “modelo”.
Com o fechamento da Casa de Passagem, diversas famílias indígenas que neste fim de ano vieram para Curitiba para comercializar seus produtos de artesanato estão nas ruas da cidade, expostas a interpéries, sem estrutura de higiene e dependendo de doações.
O Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) buscou uma mesa de diálogo com a prefeitura, mas a gestão Rafael Greca está se mostrando intransigente e até o momento não apresentou uma única proposta que leve em consideração as necessidades dos indígenas. A prefeitura insiste em oferecer aos indígenas o mesmo tratamento destinado à população em situação de rua, desconsiderando peculiaridades culturais.
Além da falta de abrigo, mulheres indígenas têm denunciado a violação de direitos por parte da Fundação de Ação Social (FAS). Desde que o grupo, oriundo da Terra Indígena Rio das Cobras de Laranjeiras do Sul (PR) chegou à Curitiba, o orgão da prefeitura têm ameaçado retirar as crianças em situação de rua e fazer um acolhimento forçado, retirando as crianças de perto de suas mães.
Os indígenas também denunciam intimidações por parte de servidores da prefeitura e da Guarda Municipal. “Eles [funcionários da prefeitura] passam o dia nos filmando ali das janelas, os guardas ficam passando aqui, mas não temos medo. Índio nunca teve medo, os assassinos sempre nos perseguiram, mas nunca fugimos. Índio não foge, índio acolhe”, afirma Jekupé, direcionando cobrança à Greca. “Esse prefeito tem que mostrar a cara, prefeito não é só pra entrar na prefeitura e receber imposto do povo”.
Segundo relato dos acampados, a prefeitura tem negado até mesmo o uso do banheiro às mulheres e crianças indígenas. “Nós queríamos arrumar banheiro e o prefeito proibiu. A gente queria colocar água aqui e impediram”, diz uma artesã da etnia Kaigang, que preferiu não se identificar.
Nesta quarta-feira (22), apoiadores da causa indígena organizaram um ato simbólico para cobrar uma solução ao problema. Questionados sobre até quando permanecerão na Praça Nossa Senhora Salete, os indígenas afirmam que ficarão até serem recebidos pelo prefeito Rafael Greca.
“A gente vai ficar aqui, pois aqui é território indígena. Curitiba é terra indígena. Essa prefeitura deveria pagar imposto para nós, então o mínimo que eles tem que fazer é nos receber”, diz Jekupé, que completa: “O povo de Curitiba tem que vir aqui nos visitar, pois essa cidade modelo não existe, é fantasia”.