*Publicado originalmente no jornal O Globo
O grande desafio brasileiro é transformar o crescimento em desenvolvimento econômico, promovendo a inclusão social de toda a população brasileira.
A inclusão bancária envolve acesso ao crédito e o direito de ter conta em banco, sem discriminação de qualquer espécie. Mas o sistema financeiro nacional, a despeito de ser o setor mais rentável da economia (somente os sete maiores bancos apresentaram R$ 26,5 bilhões de lucro líquido no primeiro semestre de 2011), não está cumprindo esse papel.
O Brasil tem hoje 20.021 agências bancárias, o mesmo número de duas décadas atrás. Os dados do Banco Central mostram que, dos 5.587 municípios do país, 1.969 (35,3% do total) não possuíam nenhuma agência e nenhum posto de atendimento bancário (PABs) em 31 de julho último.
Mais da metade (54,7%) das agências e PABs estão concentrados no Sudeste, sendo um terço (33,38%) somente no Estado de São Paulo. Inversamente, no Nordeste não há sequer uma agência ou posto de atendimento em 51,95% dos municípios, chegando a 79,91% no Piauí. O resultado é que 40% dos brasileiros – e 52,6% dos nordestinos – não têm conta em banco.
Os correspondentes bancários foram criados para levar atendimento para regiões onde os bancos não chegavam, como na Amazônia. O que se vê hoje é que eles estão localizados, sobretudo, nas grandes cidades para atender as pessoas de baixa renda e os pobres. Não é à toa que, dos 161 mil correspondentes existentes hoje no país, 45% estão concentrados no Sudeste, sendo 25,6% somente em São Paulo. Apenas 20,9% estão no Nordeste (e 1,23% no Piauí).
As resoluções nº 3.954 e 3.959, de fevereiro e março de 2011, baixadas pelo Conselho Monetário Nacional, no lugar da regulamentação do sistema financeiro pelo Congresso Nacional, permitem na prática que os correspondentes exerçam quase as mesmas funções que as agências e, por isso, vão agravar o problema.
Em vez de levar crédito e assistência financeira a regiões distantes e carentes, sua razão de existir, os correspondentes estão na verdade sendo utilizados para segregar e excluir. Eles estão geograficamente situados nas imediações das agências e é para onde os bancos estão empurrando a clientela de baixa renda.
Essas novas resoluções permitem ainda que os próprios bancos criem correspondentes, que podem ser terceirizados e quarteirizados para reduzir custos. Os clientes, além de segregados, ficam desprotegidos de orientação financeira e correm riscos adicionais tanto em relação ao sigilo bancário quanto à segurança física. Se a violência já é grande, com três mortes em média por mês em assaltos envolvendo bancos, o risco é ainda maior nos correspondentes, desobrigados de cumprir a Lei nº 7.102/83, que exige plano de segurança para as unidades com movimentação de numerário.
Não defendemos o fim dos correspondentes, mas a sua transformação em postos de atendimento e agências pioneiras para levar serviços bancários para as regiões desassistidas, com assistência financeira a toda a população, sem discriminação de condição econômica e social, com segurança e sigilo bancário preservado. Os bancos são o segmento que mais lucra na economia. Essa deveria ser a sua contrapartida social para ajudar o Brasil a se desenvolver.